10 de jan. de 2010

JOÃO RAMALHO E OS GUIANÁS NO PLANALTO





Com surpresa constatou Martim Afonso de Souza que, já no dia seguinte à sua
chegada à ilha de São Vicente, ao desembarcar foi recepcionado por João Ramalho,
acompanhado por grande comitiva, vindos do planalto de Piratininga onde viviam.
Como pudera o degredado português saber, tão prontamente, da chegada do importante
emissário do rei de Portugal? As atividades exercidas por Ramalho e sua localização no planalto explicam o que não seria coincidência ou premonição. Ramalho vivia na taba dos Guaianás, chefiada pelo cacique Tibiriçá, cuja filha Potira (ou Bartira) tomara como esposa e da qual já possuía vários filhos e filhas. Tibiriçá dominava a região de Piratininga junto com seus irmãos Caiubi e Piquerobi, estes estrategicamente localizados o primeiro na região sul, próximo à confluência dos rios Guarapiranga e Jurubatuba (região denominada de Ibirapuera e depois Santo Amaro) e o segundo na região leste, ás margens do rio Anhembi, ou Tietê (local chamado Uraraí e depois São Miguel Paulista).


A taba de Tibiriçá situava-se próxima à nascente do rio Tamanduateí, num local
denominado Guapituba (em terras do atual município de Mauá). A uma distância de menos de duas léguas dali Ramalho instalara um posto de observação permanente de toda a orla de São Vicente (a atual Vila de Paranapiacaba, outro “local de onde se avista o mar”). O interesse era acompanhar a entrada de navios na baía e no porto. Se fossem invasores, descia com sua tropa de portugueses, índios e mamelucos para lhes dar combate (como o fez em outras ocasiões). Ou, então, seriam parceiros com os quais poderia traficar índios inimigos, aprisionados em combates.
Ramalho e outros degredados que o rodeavam, viviam em boa paz com os índios amigos, cujos costumes que lhes apraziam logo absorveram, sem tentar lhes impingir os seus. Entretanto, o ritual de devorar os prisioneiros inimigos era abominado por eles. De modo matreiro, acenando com os utensílios, ferramentas, armas e munições que podiam obter no escambo com os mercadores que aportavam em São Vicente, foi fácil convencê-los de que era melhor vender os escravos do que come-los apenas ritualmente, posto que aos próprios índios deveria apetecer mais a carne da caça e da pesca, sua alimentação mais constante. A ausência de referências históricas de que, à época da catequese dos jesuítas, estes duros padres tivessem que combater a antropofagia dos indígenas, pode ser indicativo de que aquele costume ritual já se acabara.
O caminho da Serra de Paranapiacaba, trilhado por Ramalho, era continuado por este após descer o Rio Jurubatuba em canoas de troncos de árvores (as pirogas indígenas). O Jurubatuba têm suas nascentes nas imediações de Paranapiacaba, e recebendo outros afluentes menores, entre os quais o Bororé, fornecia caudal necessário à navegação fluvial tão primitiva.
Fonte:
Antonio Joaquim Andrietta: www.novomilenio.inf.br